PALESTRA GESTÃO FINANCEIRA - EDUCO 2017




Mário Capp

Tenho recebido algumas solicitações para comentar aspectos da palestra que proferi na EDUCO BRASIL 2017, a respeito da gestão financeira nas Instituições de Ensino. Peço desculpas, mas só agora consegui escrever.
Meu ramo de atuação é administrativo-financeiro, voltado para pequenas e médias empresas, que buscam a profissionalização de sua área administrativa. Observando os históricos de fundação dessas empresas temos, em sua grande maioria, as empresas familiares, nas quais houve uma evolução no segmento pedagógico, mas que não foi acompanhado por um desenvolvimento no segmento administrativo, com consequências catastróficas quando de seu crescimento.
Um dos grandes problemas é o grau de informalidade nas relações institucionais. É muito comum a confusão de funções, as relações truncadas e o curto-circuito na hierarquia causado pela figura do(s) proprietário(s) da escola, que transita(m) na estrutura interferindo em praticamente todos os processos. Esse é o principal fator que leva a falta de autonomia das pessoas, pois nada acontece sem o aval final do proprietário. Por mais caricata que seja a situação, ela é ainda muito comum em pequenas e médias empresas do segmento educacional.
Deixando de lado esse, que é o maior problema em minha opinião, e que merece uma discussão exclusiva, ater-me-ei a uma visão técnica sobre as principais dificuldades enfrentadas no setor financeiro das pequenas instituições educacionais.

1-      Não separação entre a figura da Pessoa Física e a Pessoa Jurídica
No âmbito financeiro costumo colocar essa situação como: “Confusão entre a conta Caixa e a conta Bolso”. Esse é o primeiro problema a ser resolvido e requer um esforço do proprietário em querer e compreender isso. Dessa forma, se não houver seu comprometimento, com a separação das personalidades, nada do que for mudado, em qualquer outro processo, terá efetividade. Portanto, planos de saúde pagos pela empresa, viagens de membros da família, pagamento de contas particulares, compra de automóveis pela empresa para uso pessoal, utilização de cartões de crédito corporativos para custear despesas particulares, entre tantas outras situações enumeráveis, devem ser custeados pela pessoa física do proprietário. Como fazer isso? Basta que haja uma política correta de remuneração dos proprietários como: pró –labore, juros sobre capital próprio, dividendos ou pagamento de aluguéis dos imóveis que pertençam ao proprietário e são utilizados pela empresa. Pode se constituir, inclusive, uma holding patrimonial para esse fim, que pode trazer também outras vantagens. Lembrando que todo esse processo deve respeitar a capacidade de caixa da empresa, requerendo um planejamento da instituição como um todo.
2-      Controle do Fluxo de Caixa
Resolvido o primeiro problema, podemos agora nos ater ao fluxo de caixa. O departamento financeiro de uma empresa deve ser conduzido por alguém com capacidade técnica para tal. Não basta a relação de confiança. Em muitas pequenas empresas educacionais que visitei, a função era exercida por alguém próximo e da confiança do proprietário e, com raríssimas exceções, o resultado alcançado era pífio. O fluxo de caixa de uma instituição de ensino é bastante simples de ser equacionado. A partir do momento em que cerca de 80% dos pagamentos são recebidos em uma única data, torna-se fácil estabelecer como serão efetuadas as saídas ao longo do mês. Por esse motivo algumas pessoas consideram que praticamente não há fluxo de caixa, e sim fluxo de pagamentos. Sempre deve haver sintonia entre o departamento financeiro e o setor de compras para um equacionamento do fluxo de caixa, o que infelizmente em muitas instituições não é seguido.

3-      Contas a Pagar e Contas a Receber
Os maiores problemas encontrados em contas a pagar são: A falta de respeito ao fluxo de caixa, efetuando-se pagamentos em datas que geram um valor negativo de caixa e o não estabelecimento de prioridade de pagamento de contas. Se em um determinado mês não houver recursos necessários ao pagamento no vencimento, deve-se negociar com fornecedores novas datas e isenção de multa. Priorizar as dívidas com o governo, pois a multa é alta em relação a falta de recolhimento no prazo. Evitar o pagamento de juros bancários desnecessários
Em relação a contas a receber, é importante o não recebimento diretamente na tesouraria da instituição, a fim de que se evitem confusões e tentações. Assim, dentro do possível, os pagamentos devem ser efetuados via boleto bancário, cartão de crédito, entre outras formas. Respeitar o binômio: Segurança – Controle.

4-      Controle Patrimonial
A maioria das pequenas empresas educacionais não tem controle sobre seu patrimônio e muitas vezes, confunde-se com o dos proprietários. É importante o estabelecimento do controle de patrimônio, quer em relação a conferência de inventário físico, quer para a perfeita contabilidade, inclusive sob o aspecto de depreciação do imobilizado, que pode ter efeitos tributários bem interessantes, dependendo do regime adotado.

5-      Provisionamento
É bastante comum a ausência de provisionamento, não só o contábil, mas principalmente o financeiro. Assim, são comuns os empréstimos em instituições bancárias, com juros extorsivos, para arcar com despesas que não foram provisionadas, como 13º salário, férias e demissões. Tudo isso requer planejamento e controle. Deve haver provisão mensal para os pagamentos que serão efetuados, bem como planejamento das férias para que o fluxo de caixa não fique negativo em nenhum momento. Também é importante a definição, principalmente da área pedagógica, em relação a demissões, para que haja contingenciamento.
6-      Remuneração dos sócios
Como já citei anteriormente, a forma de remuneração deve ser planejada, de forma a propiciar retirada condizente para os proprietários e manutenção da empresa. É importante a consulta a profissionais para o estabelecimento da forma mais adequada de remuneração, que deve estar atrelada também, ao regime tributário da instituição de ensino.

7-      Planejamento Estratégico X Gestão Financeira
Em muitos casos não existe um planejamento estratégico nas pequenas instituições de ensino, ou quando se tem, é pró-forma. O planejamento estratégico deve estar associado a capacidade financeira da empresa, quer a nível de expansão física, compra de equipamentos ou mesmo a demissões e contratações.
  
8-      Planejamento Tributário
A ausência de planejamento tributário é uma constante comum. Dessa forma o enquadramento da empresa nos regimes do Simples, Lucro Presumido e Lucro Real fica enormemente prejudicado e muitas vezes se dá sem o devido cuidado legal. É importante a consulta a profissionais especializados em tributação para a análise de cada caso em particular, pois muitas vezes, paga-se mais tributos do que o necessário, em virtude do enquadramento inadequado da instituição de ensino.
Para o correto enquadramento é de vital importância uma contabilidade que reflita a situação real, decorrente do que foi discutido nos itens anteriores.

9-      Cálculo correto do valor da mensalidade
Deixei esse ponto por último pois ele é reflexo de tudo o que foi apresentado. Só teremos condições de cálculo correto do preço de cada mensalidade se estivermos com a contabilidade adequada e fidedigna, o que implica em uma gestão financeira adequada e afinada com o planejamento estratégico da instituição de ensino. Também deve haver o enquadramento correto da empresa ao regime tributário, para que possamos analisar os impactos dos recolhimentos e dos tributos.
Para um controle e determinação corretos do valor da mensalidade, são imprescindíveis, a integração e alinhamento de informações dos departamentos contábil, financeiro e de recursos humanos, através de um sistema de gestão empresarial. Com as informações recebidas, podemos iniciar um processo orçamentário, pois sabendo o quanto se gasta e o quanto se recebe podemos trabalhar de forma gerencial com acompanhamento de cada conta, de cada item, com seu centro de custo específico, construindo o orçamento da instituição e o posterior acompanhamento (previsto x realizado), e o mais importante: saber o custo de cada aluno em cada segmento.


Não há mais espaço no mercado educacional para empresas que atuem desconectadas de um profissionalismo nos processos administrativos e financeiros. O aspecto pedagógico é a razão de existir de uma instituição de ensino, mas ele deve manter sintonia com o restante da empresa. Torna-se evidente que a falta de uma política de implantação e desenvolvimento administrativo-financeiro poderá, a médio prazo, comprometer o próprio processo pedagógico e, consequentemente, a instituição. A profissionalização, portanto, é uma questão de sobrevivência.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O PIOR ENSINO MÉDIO DO MUNDO?

RENTABILIDADE E LUCRATIVIDADE - CONCEITOS BÁSICOS

O (DIFÍCIL) MOMENTO DAS ESCOLAS PARTICULARES NA PANDEMIA DO COVID-19