O (DIFÍCIL) MOMENTO DAS ESCOLAS PARTICULARES NA PANDEMIA DO COVID-19


Nas minhas palestras brinco que a palavra desconto parece ter nascido associada à palavra escola. A prática tornou-se tão diferenciada neste setor que muitas vezes se supereleva o valor da mensalidade, pois é senso comum que nenhum aluno irá pagá-la. Sobre esse valor incidem os descontos, com as mais diversas denominações (irmãos, fidelidade, financeiro, pontualidade, etc). Ao final o valor pago pelo aluno é uma fração, algumas vezes inferior a 50% da mensalidade originalmente estipulada.

Particularmente sou contrário à prática do desconto indiscriminado. Na maioria dos casos é comum a perda, tanto por parte do dono da escola, como por parte do cliente, da real percepção de valor do serviço. Acredito na importância da fixação do preço real, ou seja, a verdadeira valoração do serviço e na forma que isso é comunicado aos pais. É preciso uma mudança de paradigma, com a real percepção do posicionamento do serviço no mercado. Sabendo comunicar-se a respeito do valor agregado desse serviço, com certeza os pedidos de desconto serão menores. Mas isso é um assunto para o pessoal de MKT.

Meu objetivo aqui é tratar do perigo dos descontos para a maioria das escolas. Grande parte dessas acaba por definir os valores da anuidade sem que tenham em mãos, por problemas de gerenciamento e procedimentos adotados, o real valor do seu custo por aluno. As causas são as mais variadas possíveis, mas chama a atenção a maneira pouco profissional com que a maioria dos estabelecimentos de médio e pequeno porte são geridos.
Dessa forma, confusões patrimoniais entre pessoa física e pessoa jurídica, falta de planejamento e falta de controle e gestão financeira são os principais responsáveis pela falta de elementos para a fixação de preços. Muitas vezes a fixação do preço ocorre exclusivamente pelo preço médio de mercado, mercado esse que também carece, muitas vezes, dos mesmos elementos da escola que fixa o preço.

Com a pandemia do COVID-19 certas situações são potencializadas. Devido ao momento, muitos solicitam descontos e com receio (justo, é verdade), de perda de alunos, algumas escolas ultrapassam um limite perigoso de concessão. O risco é que a partir do momento que não se tem o custo real pré-estabelecido, um desconto tem grande chance de tornar-se prejuízo. Tomemos como exemplo escolas que oferecem um desconto linear de até 30% sobre o valor da mensalidade. Ocorre que a grande maioria tem uma margem de lucratividade baixa (entre 10 e 15%), insuficiente para absorver o desconto linear dado. Se o momento do desconto for pontual, por 2 ou 3 meses, ainda é possível absorver esse prejuízo, mas de outra forma, literalmente a instituição terá dado um “tiro no pé”.

Mesmo que não haja um desconto linear, a somatória dos descontos individuais concedidos deve ter seu impacto avaliado sobre o total do faturamento, de forma a não comprometer a margem de segurança da instituição.

Essas situações sempre aconteceram nas escolas, mas são potencializadas pelo momento da pandemia. Descontos acima do suportável financeiramente, aliados a uma inadimplência e evasão certamente maiores são um prenúncio de sérias dificuldades para o setor, inclusive inviabilizando o prosseguimento das atividades para alguns. Em suma, uma situação como a de conceder descontos sem a aferição do potencial destrutivo, prática recorrente em muitas escolas, devido ao momento, pode tornar-se a causa da saída de muitas empresas do setor educacional.

O que fazer então em um momento como esse?

Sugiro duas frentes de atuação. Primeiramente uma emergencial buscando a adequação dos descontos a um mínimo sustentável em função do novo faturamento, fruto das evasões e aumento da inadimplência. A implantação de um setor de renegociação e, veja, não necessariamente descontos, buscando a compreensão da situação de cada família e o equilíbrio entre o solicitado e que pode ser oferecido, com a distensão de prazos e condições de pagamento, de forma a mitigar a perda de alunos.

Em segundo lugar, proponho o início de um planejamento efetivo para o ano seguinte, com o ajuste de folha salarial (que é o maior gasto), adequações e cortes nas despesas e nos investimentos, e principalmente, a mensuração do quanto será necessário de receita para que a escola consiga manter-se. Vejam que isso é um trabalho emergencial para adequações com o intuito de sobrevivência. Todo o ano seguinte deve-se focar no fluxo de informações que permitam uma leitura gerencial financeira mais correta da instituição.

Consequentemente, e naturalmente, surgirão mudanças. Ressalte-se, entretanto, que toda mudança, seja ela planejada ou não, traz consigo uma conotação traumática, pois impacta diretamente na manutenção do “status quo”. Mudanças sofrem resistências, mas esse é o momento de realizá-las. Um choque de gestão, não só é bem-vindo, mas necessário e deve ser implementado de forma planejada e com foco na sobrevivência da instituição.

Os sinais de mudança sempre acompanharam a escola, mas muitas vezes não houve o necessário estímulo para implementá-las. O momento atual requer esse desprendimento para as mudanças necessárias. Estamos falando agora de sobrevivência, e talvez seja a última chance de recolocar a escola no seu caminho para a prosperidade.

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